segunda-feira, 28 de junho de 2010

Serra não entende das lutas das mulheres

Segundo o candidato, a legalização do aborto “Dificultaria o trabalho de prevenção... Vai (ter) gravidez para todo o lado porque (a mulher) vai para o SUS e faz o aborto”, “seria uma carnificina”, disse o candidato, demonstrando retumbante ignorância dos números que acompanham a tragédia dos abortos inseguros no país, bem como da subjetividade feminina.


O candidato tucano à presidência, José Serra, posicionou-se contra a descriminalização do aborto em sabatina promovida pelo jornal Folha de S. Paulo e pelo portal UOL, na capital paulista. A legislação atual no Brasil só permite o aborto em casos de estupro ou de risco de morte para a mãe e é uma das mais restritivas do mundo. (Dia 21/06).

Estima-se que, ainda assim, mais de 1 milhão de abortos clandestinos sejam realizados no país, resultando em mais 250 mil internações no SUS e na quarta causa de mortalidade materna no Brasil. Contradizendo o raciocínio de Serra, os países onde o aborto é legalizado apresentam as menores taxas de abortamento do mundo, bem como de mortalidade materna (na Holanda, por exemplo, encontra-se abaixo de 1%). Isto porque a legalização do aborto veio acompanhada de uma política de planejamento familiar, com educação sexual e acesso fácil à contracepção. Tal como defendido historicamente pelo movimento feminista aqui no Brasil.

Disto se conclui que não é a proibição, mas o acesso à contracepção e educação sexual que evitam abortamentos. Corrobora com esta tese o dado de que os maiores índices de abortos estão nos países onde sua prática é considerada crime, em geral países pobres e/ou sob forte influência religiosa no Estado. Nestes sim ocorrem verdadeiras carnificinas, mas de mulheres que se submetem aos procedimentos mais grotescos para interromper uma gravidez indesejada, muitas vezes resultando em infecções uterinas que podem esterilizar e até matar. Realizado de forma legal e segura, o aborto é um procedimento cirúrgico ou medicamentoso simples.

Ou seja, o argumento utilizado por Serra, de que a descriminalização do aborto "Dificultaria o trabalho de prevenção, como no caso da gravidez na adolescência, que é um assunto muito grave. Vai (ter) gravidez para todo o lado porque (a mulher) vai para o SUS (Sistema Único de Saúde) e faz o aborto", baseia-se na idéia de que realizar um aborto para uma mulher é um piquenique, um passeio dominical, algo banal e corriqueiro. Nada mais distante da subjetividade feminina que tal impropério.

Já está claro que o candidato não possui um projeto de nação para o Brasil, então ele se lança a “achologias” -- neste caso, bastante machistas -- sobre temas aparentemente acessórios, mas que revelam sua concepção de mundo (de direita, patriarcais, racistas e homofóbicas), além de bastante desinformação e despreparo, e que são repercutidas pela mídia hegemônica como opiniões das mais sábias e consubstanciadas.

Ser mãe é um direito, não uma obrigação

A decisão acerca da realização do aborto ou não é de foro íntimo e não cabe ao Estado, que se supõe laico. E o candidato tucano deveria saber disso. Contudo, não se pode acusá-lo de incoerência: criminalizar as mulheres que abortam é bastante condizente com quem se recusou, durante 11 meses, enquanto governador do estado, a assinar o Pacto Nacional Pelo Fim da Violência Contra a Mulher, proposto pelo Governo Federal; e que submete as gestantes do estado de São Paulo à realização de partos sem anestesia, como revelou relatório “secreto” da Secretaria Estadual de Saúde. Coerente também com quem, para desqualificar a candidata da situação ao pleito presidencial, acusa de “não ser líder”, aquela que é “a mãe do PAC”. Baixaria machista pura e aplicada.

Apesar da posição conservadora a respeito do aborto, o candidato se disse favorável à união civil de homossexuais e à adoção de crianças por casais do mesmo sexo. Entretanto, cometeu um ato falho: "Tem tanto problema grave de crianças abandonadas no Brasil que, para elas, é uma salvação", disse. Ou seja, a adoção de crianças por homossexuais só seria aceitável porque sem isso elas estariam em situação muito pior, e não porque o Estado brasileiro deve encarar as novas formas de organização familiar sem preconceitos e respeitar os direitos das famílias homoafetivas.

Completando a onda de preconceitos, Serra se colocou também contra as cotas raciais.

O verdadeiro atraso
Serra admitiu ter um "problema com o relógio". Ele chegou à sabatina com 44 minutos de atraso e disse ter perdido a hora ao analisar notícias do dia. "Eu detesto me atrasar. Isso posso dizer em minha defesa. Eu sofro também, como aqueles que esperam", disse. A ele digo o seguinte: não se aflija, candidato, esses 44 minutos não significam nada perto do atraso de 5 séculos que você e sua camarilha neoliberal irão impor ao povo brasileiro caso retornem ao governo. O que, no que depender do movimento de mulheres e das forças progressistas, não irá acontecer jamais. Estamos todos com Dilma para avançar, avançar e avançar!


Por Mariana de Rossi Venturini, da União Brasileira de Mulheres e da União da Juventude Socialista.

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